10 novembro 2005

Este texto foi publicado em 98 e vejam como ainda é atual.
Publicado em O Jornal da Tarde, 14/01/1998
As gordinhas no trabalho
José Pastore

A questão da discriminação no trabalho está longe de ser resolvida até mesmo nos países desenvolvidos. E isso me perturba muito. Não acho correto barrar pessoas competentes porque são desta ou daquela maneira. Afinal, o trabalho não é passarela de beleza.
No início de 1997, a Delta Airlines despediu um grande número de aeromoças porque estavam com excesso de peso. Achei injusto, mesmo porque estou dentre os que, há anos, vêm lutando, sem êxito, para tirar 10% de excesso...
Cerca de 20 aeromoças recorreram à Justiça pois, nos Estados Unidos há uma lei federal que proíbe vários tipos de discriminação nas relações de trabalho. Naquele país, já há advogados especializados na defesa de trabalhadores que são discriminados por motivo de obesidade (Obesity Law & Advocacy Center, San Diego, California).
Apesar de usar bem a lei e invocar todos os seus direitos, as aeromoças perderam a ação. A Delta Airlines convenceu o juiz de que o exagerado volume das funcionárias, além de ralentar seus serviços, não se ajustava aos exíguos espaços das aeronaves.
Não houve jeito. As gordinhas perderam o emprego e tiveram de pagar as custas dos advogados dos dois lados - o que fez emagrecer bastante as suas poupanças...
A obesidade nos Estados Unidos é um problema grave. Entre 1960-96, as pesquisas registraram um aumento de 33% na incidência desse mal. Na Inglaterra, o problema também se agrava: entre 1980-94, a proporção de obesos dobrou. Na Austrália, a população vem adicionando uma grama por dia. Nos últimos 10 anos, isso significou mais de 3,5 quilos!
é claro que um problema dessa natureza tem de ser resolvido no campo da saúde pública e não no campo do trabalho. Será que, com essa "demissão das massas", a Delta Airlines vai corrigir os hábitos alimentares do povo americano? Penso que não.
O Brasil também tem seus problemas de discriminação, sem dúvida. Mas, não desse tipo. Felizmente.
Há pouco tempo fiquei sabendo de um caso interessante nesse campo. O estilista Ocimar Versolato foi convidado pela VARIG para desenhar os novos uniformes das tripulações de bordo. Na hora de tirar as medidas, Versolato descobriu que as aeromoças da VARIG estavam todas acima da idade média para essa categoria profissional e, sobretudo, acima do peso (O Estado de S. Paulo, 18/11/97). Um cálculo apressado deu um excesso de 15 anos de idade e dez quilos de peso.
A empresa teria fortes razões econômicas para preferir aeromoças mais magras. Como são 3 mil aeromoças, os aviões da VARIG estão voando com um excesso de 30 toneladas. Trata-se de um peso apreciável para um tipo de transporte em que cada quilo de excesso é cobrado na base de 1% do preço da passagem de primeira classe.
Para economizar combustível, seria tentador contratar 3 mil manequins esqueléticos com 20% a menos do peso normal. Mas, pelo que sei, a empresa não cogitou disso e nem despediu suas dedicadas funcionárias.
Francamente, estou inconformado com essa marcação contra as gordinhas. A conduta da Delta Airlines mostra que as discriminações estão se tornando cada vez mais sofisticadas. Já foi o tempo em que o preconceito se limitava aos negros, mulheres, idosos, gays e deficientes. Hoje em dia, os preconceitos enveredam para aspectos mais sutis como é o caso do peso. Numa hora em que o emprego está tão difícil, é lamentável ver surgir mais um tipo de discriminação trabalhista.
Acho que nesse ponto sou antigo. Sei lá... Sou mais chegado à filosofia do Roberto Carlos que, com sua grande sensibilidade, soube dar o devido valor às gordinhas e as mulheres acima de 40... Abaixo os discriminadores do peso e da idade!

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